O Estado das Coisas
Já ouvi designers dizerem que o uso abusivo da palavra "design" devia ser regulamentado segundo parece, há gente a mais a usá-la. Infelizmente para eles, "design" é o grande adjectivo da nossa sociedade de consumo. De acordo com a publicidade, qualquer pessoa pode aceder aos produtos do design e mesmo aos seus processos e metodologias sem precisar de qualquer formação prévia. Afinal, ninguém pede o diploma de designer na venda de um MacIntosh, um Adobe InDesign ou uma fonte da Emigre.
Nesta altura da conversa, alguém geralmente um designer contrapõe que os designers dominam uma linguagem própria com uma longa tradição que aprenderam num curso universitário e etc. Seria um bom contra-argumento se fosse totalmente verdade. Aqui em Portugal, a maioria dos designers jovens e não só sente-se isolada de qualquer tipo de tradição ou mesmo comunidade. A nossa história e teoria do design são em larga medida mantidas por tradição oral, não havendo praticamente nenhuma publicação que cubra os últimos trinta anos da actividade. A pouca história que consumimos é investigada em outros países, importada e consumida como um catálogo de tendências a copiar.
No meio académico as coisas não são muito melhores. A obrigação tácita de que todos os professores devem ser também designers praticantes impede as escolas de fazer qualquer tipo de actividade crítica em relação ao design local. Pode-se discutir ou investigar o que se quiser, desde que só se chegue às conclusões do costume e, também aqui, o tribunal de última instância acaba por ser essa entidade mal definida a que se chama "lá fora".
O design de comunicação é, por natureza, uma coisa efémera, cuja pertinência é local e actual; fazer o outsourcing da nossa crítica e da nossa história só sublinha a falta de valor intelectual e social do design português. Ou seja: se o design for inovação, em Portugal isso significa apenas estar menos atrasado. Nunca se tratou de produzir algo de novo, mas de ser o primeiro a consumir algo que já esteja mais do que digerido "lá fora". O design português, com a sua mentalidade de modista que espera pelos modelos vindos de Paris, deseja e mantém o atraso porque ele ajuda a definir a sua identidade de filial do gosto cosmopolita, queixando-se entredentes da incompreensão dos "nativos".
Quando se chega a esta parte do diagnóstico alguém diz logo que é assim em todo o lado e que as coisas não estão assim tão mal. É um bom argumento se não houver demasiadas ambições, evidentemente e que pode ser apoiado por uma versão portuguesa daquela ideia de que o bom design é invisível. Originalmente, isso queria dizer que o bom design é invisível para toda a gente menos para os designers, mas aqui tem um significado ligeiramente diferente. O "cálice de cristal" de Beatrice Warde simbolizava transparência; a invisibilidade do design português é opaca, enquistada e corporativista. É uma invisibilidade que procura manter um consenso artificial e forçado e que procura evitar responsabilidades e discussão, enquanto se espera pela próxima remessa de soluções pré-fabricadas. Na melhor das hipóteses, o design português é tão invisível como o fato novo do rei.
Nesta altura da conversa, alguém geralmente um designer contrapõe que os designers dominam uma linguagem própria com uma longa tradição que aprenderam num curso universitário e etc. Seria um bom contra-argumento se fosse totalmente verdade. Aqui em Portugal, a maioria dos designers jovens e não só sente-se isolada de qualquer tipo de tradição ou mesmo comunidade. A nossa história e teoria do design são em larga medida mantidas por tradição oral, não havendo praticamente nenhuma publicação que cubra os últimos trinta anos da actividade. A pouca história que consumimos é investigada em outros países, importada e consumida como um catálogo de tendências a copiar.
No meio académico as coisas não são muito melhores. A obrigação tácita de que todos os professores devem ser também designers praticantes impede as escolas de fazer qualquer tipo de actividade crítica em relação ao design local. Pode-se discutir ou investigar o que se quiser, desde que só se chegue às conclusões do costume e, também aqui, o tribunal de última instância acaba por ser essa entidade mal definida a que se chama "lá fora".
O design de comunicação é, por natureza, uma coisa efémera, cuja pertinência é local e actual; fazer o outsourcing da nossa crítica e da nossa história só sublinha a falta de valor intelectual e social do design português. Ou seja: se o design for inovação, em Portugal isso significa apenas estar menos atrasado. Nunca se tratou de produzir algo de novo, mas de ser o primeiro a consumir algo que já esteja mais do que digerido "lá fora". O design português, com a sua mentalidade de modista que espera pelos modelos vindos de Paris, deseja e mantém o atraso porque ele ajuda a definir a sua identidade de filial do gosto cosmopolita, queixando-se entredentes da incompreensão dos "nativos".
Quando se chega a esta parte do diagnóstico alguém diz logo que é assim em todo o lado e que as coisas não estão assim tão mal. É um bom argumento se não houver demasiadas ambições, evidentemente e que pode ser apoiado por uma versão portuguesa daquela ideia de que o bom design é invisível. Originalmente, isso queria dizer que o bom design é invisível para toda a gente menos para os designers, mas aqui tem um significado ligeiramente diferente. O "cálice de cristal" de Beatrice Warde simbolizava transparência; a invisibilidade do design português é opaca, enquistada e corporativista. É uma invisibilidade que procura manter um consenso artificial e forçado e que procura evitar responsabilidades e discussão, enquanto se espera pela próxima remessa de soluções pré-fabricadas. Na melhor das hipóteses, o design português é tão invisível como o fato novo do rei.