segunda-feira, novembro 21, 2005

Como Exportar o Design Gráfico?

A própria pergunta induz em erro. Dá a entender que estamos a falar de um produto material. No entanto, não se pode vender o design gráfico como se fosse um mero objecto. O design gráfico não é uma cadeira, um vestido ou um bidão de petróleo. Está demasiado dependente do contexto local, da língua e da sociedade. A única maneira de o exportar é como prática cultural. Promovendo-o entre os diversos designs de cada país, entendidos também eles como práticas culturais. Promovendo as instituições culturais nacionais ligadas ao design – escolas, associações, revistas, palestras, blogues, etc. É assim que os designers suíços, holandeses, ingleses, italianos e americanos “vendem” o seu design. Se existem designers portugueses conhecidos “lá fora”, é porque “lá fora” estas instituições são criadas, mantidas, promovidas, acolhendo o talento internacional que encontram pelo caminho.

Nesse aspecto, a arquitectura portuguesa é um exemplo a seguir. Há uns tempos, na televisão, Siza Vieira referiu-se às obras de Fernando Távora como contribuições para o que ele chamava o “debate da arquitectura.” Efectivamente, além das próprias obras contribuirem para este debate, há cada vez mais arquitectos a escreverem sobre arquitectura – e mesmo design – em publicações especializadas e na grande imprensa. Em contrapartida, poucos designers portugueses falariam do “debate do design.” Se existe algum, ele é internacional e o nosso Design limitou-se a assistir passivamente.

Digo “limitou-se” porque as coisas estão a mudar. Há cada vez mais designers portugueses. E essa comunidade crescente está cada vez mais sedenta de representação efectiva na sociedade. Mais participativa, mais activa do que era há uma década atrás, e isto revela-se principalmente através dos blogues criados e mantidos por designers. Tal como foi referido por Luís Inácio (também ele blogger), estes blogues vão formando uma comunidade, vão formando ligações. Se o DesignObserver e o UnderConsideration, entre outros, revolucionaram o jornalismo de Design, tornando-o mais regular e mais acessível (sobretudo no preço), os blogues portugueses vêm ocupar um vazio, onde as publicações são raras e pouco duradouras.

Apesar de tudo há a tendência para não levar os blogues a sério e para minimizar a necessidade (e a possibilidade) dos designers escreverem sobre o design. Num debate da APD no Porto, Henrique Cayatte chegou a afirmar que a crítica de design devia ser deixada para os jornalistas e para os teóricos vindos de outras áreas. Tais afirmações contrariam a própria história do design, onde a maioria dos designers conhecidos foram também teóricos e críticos do design: William Morris, Eric Gill, Muller-Brockmann, Rudy VanderLans, Erik Spiekermann, Jan Tschichold, Jeffery Keedy, etc., etc.

É urgente promover em Portugal a escrita sobre design – por designers e não só. O design português só será exportável quando começarmos a entende-lo como a prática cultural que é.

10 Comments:

Blogger theSIGNer said...

A "crítica" é raramente utilizada de forma construtiva.
Parecem termos completamnte opostos, distintos.

Nunca ouvi uma "crítica" construtiva.
E, afinal, de que serve atacar ainda mais "os nossos"?
Uma classe com pés de barro, conflituosa (para com ela própria) como a nossa, precisa mesmo de ter ainda mais crítica?

Tenho um blog, mas este nasceu de uma necessidade de, não só me dar a conhecer (admito-o) mas também de ter a participação de outros (designers ou não)não para "criticar". Também não tenho conhecimentos ou razões para criticar. Outra das razões do seu aparecimento foi a Experimenta Design de 2005, que aplaudo de pé.

Sei que ainda sou "verdinho" e que se calhar não abordo com a profundidade necessária temas ou acontecimentos, mas aos poucos vai-se aprendendo.

Teorizar, num país como Portugal, não dá sustento a ninguém. E não será um Blog que vai ser a voz dos designers.

Serve, no meu entender, pelo menos para ter uma ideia (não geral) do que se passa no Design português. Porque, de facto, não há imprensa escrita ou visual que aborde a problemática dos designers.

Além de ninguém saber o que de facto é o design e o que é que um designer faz, continuo a achar que a mentalidade de 99% dos portugueses não sabe sequer quando está perante um objecto/exercício visual de design.

O design continua ainda a ser tudo o que estiver fora do alcance económico da maioria... ou então é algo "de artista"...

Fugi um pouco à "exportação" mas não seria preferível que primeiro tivéssemos o reconhecimento em Portugal?
Seria... mas, infelizmento, só há reconhecimento "cá dentro" quando conquistamos algo "lá fora".

Mário Preto Fonseca

1:37 da manhã  
Blogger joao said...

O "design gráfico" já não é exportável, muito será-o ainda muito menos será a partir de agora. Tenho assistido a discussões/conferências/debates/exposições à volta da identidade do design Holandês. É um tema quente aqui, uma vez que a globalização vai (con)fundindo a noção de território cultural. Quero realçar que auto-estima é elevada nos estúdios de design holandeses. Sabem que influenciaram a cultura visual global tanto como os suiços. Não exportaram design gráfico, foram investindo em emigração. Rick Vermeulen e Gerard Hadders, por exemplo, que estiveram em Los Angeles durante os anos 90 depois de formarem e desenvolverem um projecto interno (Hard Werken) não são dois exemplos de exportação mas antes dois colonizadores culturais.
Fizeram-no apenas aos 40 ou 50 anos, mesmo tendo todas as condições para o fazerem antes. Agora não têm nada para exportar porque sempre foram influenciando e cruzarando estratégias visuais e culturais (desde a Renascença) vão insitindo na ideia sofisticada da exportação de ideias. No texto Mad Dutch Disease (download) pode ler-se um pouco acerca de toda a complexidade do processo de intercâmbio cultural do design holandês. "The production and consumption of style has accelerated so quickly, been broadcast so widely, that trends and countertrends developsimultaneously. Action and reaction are linked inextricably. This is due in part at least to the fact that you really do have a culture of design here, a culture of experiment, bla, bla, bla..." Em suma agora o Design Holandês não tem identidade. Exporta-se que ideia? Que conceito?

Paremos de vez com a culpabilização do público "continuo a achar que a mentalidade de 99% dos portugueses não sabe sequer quando está perante um objecto/exercício visual de design"!!!... Isso já não é um problema porque a taxa de alfabetização visual subiu exponencialmente nas últimas duas décadas. Provavelmente estudamos design à custa deste facto.
Apesar de achar que uma fundação similar à Premsela (Dutch Design Foundation) poderá funcionar como catalizador da discussão no design compreendo que em Portugal não estão reunidas as condições económicas para suportar um briquedo desses. E por enquanto os meios gratuitos vão alargando o "cenário".

3:34 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Não sei até que ponto é que o design gráfico “português” se poderá colocar melhor na posição do “Vinho do Porto” ou na do “Galo de Barcelos”, e não sei se me interessa caricatura-lo a esse ponto. No fundo os holandeses usam socas, os alemães meias branca com sandálias (e os suecos também), e os ingleses chapéu de coco, e no fundo isso não interessa nada porque não passam de pré-noções facilmente desmontáveis.
E é isso que me chateia, o facto de sermos levados a crer que uma raiz cultural é melhor que outra por esta ou aquela razão, e mais, que exportá-lo é um factor de distinção. A questão valorativa castra o mais importante, a interacção que está na base de todo o desenvolvimento humano. Nós, e os outros, não somos culturalmente melhores nem piores, temos as nossas especificidades.
A galinha da vizinha, para mim, é tão boa quanto a minha, dá ovos e eventualmente fará canja no fim, e a qualidade (da canja e dos ovos) depende do tipo de milho que lhe dou.
Não há “design português” sem haver “design espanhol”, “britânico”, “holandês”, “americano” ou do-raio-que-o-parta, porque necessariamente tocam-se, experimenta-se a curta distância, observam-se com facilidade. Os contextos globais e locais cada vez mais confundem-se, misturam-se.
O que realmente importa é que exista design, e essa é uma disciplina apoiada na fusão de diferentes correntes (culturais, estéticas, propagandísticas e, quer queiramos quer não, económicas), não é um bem culturalmente patenteado por mais específico que seja.
o design de raiz cultural portuguesa é um fórmula que podemos ambicionar, mas não podemos ignorar que ele em si é uma construção abstracta fundida na, e pela, contemporaneidade, que é em si um traço global moldado pelos diferentes contextos locais.
Há a necessidade de distinguirmos as coisas, mas isso não passa de uma ampliação temporal e casuística que somos levados acreditar.
O que é importante é que distingamos as coisas, que pensemos criticamente (observar o que existe de bom e de mau, apreciar) e depois tomemos consciência da realidade.
No fundo o mundo é a cores.

ps: “Teorizar, num país como Portugal, não dá sustento a ninguém. E não será um blog que vai ser a voz dos designers”. Não posso deixar de concordar, mas também não podemos continuar a concordar.

10:32 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Bom, os docentes universitários portugueses só podem manter o emprego se teorizarem regularmente (mestrado, doutoramento), embora no caso dos cursos de design a produção não seja em geral evidente…

2:52 da tarde  
Blogger theSIGNer said...

Nós já exportamos muito de Portugal.
Como, por exemplo, através da emigração de cérebros. Ontem no "DIAd", a revista de economia do PÚBLICO descobri que Portugal bate o recorde europeu da "fuga de cérebros" (dados de um relatório do Banco Mundial).

Ou seja, a emigração é cada vez mais a solução para quem tem valor, seja no Design ou em áreas distintas.
Não é "exportaro design", é mais "exportar os designers", que em Portugal parecem não ter qualquer utilidade. Felizmente, ou infelizmente (para nós), há quem entenda a necessidade e a utilidade de um Designer. Infelizmente parece que para ter essa capacidade apenas é preciso ter uma lingua materna diferente da Lusitana...

"design de raiz cultural portuguesa é uma fórmula que podemos ambicionar"
Concordo, mas vivemos numa sociedade globalizada, que já não tem grandes ligações com o passado.

O ano passado "trabalhei" o Artesanato de Nisa e estudei sobre isso. Há muito para aproveitar nas raízes da Arte Popular Portuguesa (sem ser o galo de Barcelos). Só precisamos encontrá-la, desenvolvê-la e assim valorizá-la.

Mário Preto Fonseca

11:20 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

"Há muito para aproveitar nas raízes da Arte Popular Portuguesa (sem ser o galo de Barcelos). Só precisamos encontrá-la, desenvolvê-la e assim valorizá-la."
ou (então) nem por isso

C.

11:09 da manhã  
Blogger theSIGNer said...

é por causa do cepticismo do "nem por isso" que tantas coisas ficam por fazer... como uma Associação de Designers digna de nome, ou uma Ordem para defender e valorizar aqueles que ainda acreditam que há algo a fazer.
Algo para fazer... isso há de sobra, só falta vontade...

...

Mário Preto Fonseca

1:07 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Em Portugal sofremos muito à custa da língua. Porque é muito complexa e repleta de segundos significados que nunca chegamos a abarcar plenamente, mas também porque o seu ensino é mau - lemos Camões na escola, mas Português corrente 'tá quieto!...

Se somos "designers" todos pensam que somos "desenhadores" (técnicos, portanto), se somos "designers gráficos" todos nos confundem com o gajo que imprime as coisas na "gráfica" (técnicos de novo), se falamos em "crítica" todos (quase...) entendem "dizer mal de" em lugar de "análise", "exame", "apreciação"... (se bem que também é sinónimo de "malidicência").

Depois anda tudo à batatada porque o crítico é um m****s invejoso que não sabe usar o Flash e que não está cá a fazer nada porque todos sabemos exactamente o que estamos a fazer.

Segundo o dicionário online da Texto Editora:

crítica:
s. f., arte de julgar o mérito das obras literárias, artísticas ou científicas;
exame, apreciação que se faz de uma obra;
discussão de factos históricos;
estudo ou análise de textos, investigação;
critério;
maledicência;
apreciação desfavorável;
censura;
conjunto dos críticos.

Antes dos livros todos da Taschen e das ComputerArts (com todos os truques e filtros do Photoshop), os designers deviam comprar dicionários.

1:16 da tarde  
Blogger Edson C. Damasceno said...

O designer gráfico verdadeiro é aquele que está na gráfico e tem que comandar a saída dos fotolitos que outrs artistas de fundo de quintal mandam sem ter nenhuma noção de como irá ficar no papel impresso seu trabalho.

2:22 da tarde  
Blogger LarapaL said...

será que foi mesmo isso que o Cayatte disse? Houve quem lá estivesse e acha que não foi bem assim? Eu não estive lá mas estou curioso em perceber a veracidade dos factos, pois este texto foca questões que nós tb gostamos de ver em discussão...

3:25 da manhã  

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